
O trabalho do tradutor em tempos de Google Translator
Por Patricia Andrade, tradutora
Há algum tempo, em uma roda de amigos, ao trocarmos figurinhas sobre situações cotidianas no trabalho, a turma do Direito disparou logo uma pergunta que já faz parte da pauta dos tradutores há alguns anos: a tradução automática substitui o trabalho do tradutor?
Respondo que não, economizando na retórica e lançando mão do argumento mais simples e mais óbvio explicando que, além de não ser essa a proposta dessas ferramentas, nem Google Translator nem qualquer outra ferramenta de tradução automática atingem um nível de qualidade adequado para se bastarem à prestação de serviços de tradução, seja ela técnica, literária, jurídica ou outra.
A você, caro leitor, ofereço uma justificativa talvez menos prosaica, senão, mais informativa.
Antes mesmo de entrarmos no mérito da qualidade e antes mesmo de cogitarmos a ideia de inserir um texto no Google para tradução, tropeçamos em uma questão fundamental, que diz respeito à ética e à confidencialidade para com o cliente. Especialmente para clientes que solicitam traduções juramentadas e corporativas, esse pode ser um ponto de atenção e de tensão, quando se toma serviços de prestadores com os quais não existe uma relação de confiança ou um termo de confidencialidade assinado e em vigor. Uma vez inserido o texto em uma ferramenta de tradução automática, não se tem controle sobre onde ele vai parar. Alguns clientes até exigem, por meio da assinatura de um instrumento legal, que a tradução automática não seja utilizada.
A maioria das CAT tools (ferramentas de memórias de tradução) até trabalha sugerindo opções de trechos traduzidos via tradução automática, mas, nesse caso, são pequenas frases e palavras, que economizam tempo para o tradutor e oferecem sinônimos ou insight que, no final, podem render um trabalho mais rápido e interessante. E aqui, precisamente neste momento, é que a competência tradutória faz toda a diferença.
Muito tem sido falado sobre a competência tradutória ultimamente, e é com grande prazer que vejo muitas concepções equivocadas sobre a profissão do tradutor serem desmistificadas na discussão do termo (PAGANO; MAGALHÃES; ALVES, 2005). Um tradutor não é o resultado da soma fluência no idioma de partida mais bons dicionários. Um bom tradutor é um articulador que alia, além do conhecimento linguístico no idioma de partida e no idioma de chegada, conhecimento técnico e de mundo, sensibilidade, experiência e qualificação contínua.
E nenhum tradutor automático preenche esses requisitos. Alguns prestadores de serviços de tradução não preenchem esses requisitos. Por isso, é importante que o cliente desenvolva essa relação de confiança e de proximidade com sua empresa de tradução ou tradutor. Assim, até a comunicação flui melhor e não soa como se fosse o produto de uma tradução automática.